Inspeção de produtos de origem animal
A legislação brasileira exige que os produtos de origem animal sejam previamente inspecionados na sua produção antes de serem ofertados ao consumo. Para aqueles que serão motivo de comercialização em todo o território nacional, ou mesmo para exportação, esta inspeção é realizada pelo Serviço de Inspeção Federal do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, instituição centenária cujas primeiras referências se reportam ao ano de 1915.
Como principio e para melhor entendimento da importância e desenvolvimento da atividade exercida por este serviço, é importante citar um dos marcos históricos que foi a lei 1.283 de 1950, que instituiu a obrigatoriedade de prévia fiscalização, sob o ponto de vista industrial e sanitário, de todos os produtos de origem animal, comestíveis e não comestíveis, regulamentada através do Decreto 30.691 de 1952 que instituiu o Regulamento da Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal que, com pequenas alterações, ficou vigente por 65 anos, quando foi substituído através do Decreto 9013/2017.
O processo de federalização da inspeção
Fato marcante que merece citação, foi a denominada federalização da inspeção instituída através da lei 5.760 de 1971, desencadeado a partir de uma reportagem na revista de nome Visão, que na edição de 6 de junho de 1970 publicou artigo denominado “Ameaça na Carne”, orientada pelo Professor I.S. Schneider, em que descrevia o total descontrole sanitário na comercialização de carnes no Estado de São Paulo, ratificando o relatório do ano de 1968 sobre o mesmo assunto, da Secretária de Agricultura do Estado de São Paulo.
Ao tomar conhecimento da gravidade do assunto que possivelmente apresentava semelhança em outros Estados da federação, o então Ministro da Agricultura, Luiz Fernando Cirne Lima, chamou a Brasília o médico veterinário do Serviço de Inspeção Federal, Dr. José Christovam Santos, para relatar a situação e propor solução. A solução proposta foi adotar a competência da inspeção de produtos de origem animal em todo o país para o Serviço de Inspeção Federal, nas seguintes bases: “É da competência da União, como norma geral de defesa e proteção da saúde, nos termos da prévia fiscalização sob o ponto de vista industrial e sanitário, inclusive quanto ao comércio municipal ou intermunicipal dos produtos de origem animal, de que trata a Lei 1283/1950”, sendo então promulgada a lei 5.760/1971.
Este processo constituiu-se na maior campanha de saneamento na área de alimentos no Brasil, e sem precedentes no mundo, que perdurou até o ano de 1989, quando através da lei 7.889, o processo de federalização foi extinto retornando a condição anterior de três instâncias de fiscalização, federal, estadual e municipal, tendo como princípio a área geográfica de comercialização do estabelecimento produtor se local, estadual ou para todo o território nacional, situação que perdura até os dias atuais.
Sistema Unificado de Atenção à Sanidade Agropecuária
Com base na lei de política agrícola de 1991, através da lei 9.712 de 1998, foi instituído o Sistema Unificado de Atenção a Sanidade Agropecuária, sob a sigla SUASA, articulado no que coubesse com o Sistema Único de Saúde, visando à promoção das ações de vigilância e defesa sanitária dos animais e dos vegetais, organizadas sob a coordenação do Poder Público das várias instâncias federativas e no âmbito de sua competência.
É importante citar a inexistência de um padrão uniforme de atuação entre as três instancias de fiscalização com diferentes legislações, muitas vezes conflitantes, concorrendo para a adoção de critérios técnicos também dispares frente à situações sanitárias análogas, levando, como tentativa de corrigir tal situação, à regulamentação através do Decreto 5.741 de 2006, instituindo o Sistema Brasileiro de Inspeção, SISBI, a permitir que os estabelecimentos sob inspeção estadual e municipal possam ter os seus produtos comercializados em todo o território nacional, desde que os serviços locais de inspeção demonstrem equivalência com os ditames do Serviço de Inspeção Federal.
Regulamento da inspeção industrial e sanitária de produtos de origem animal
Em 2017, o regulamento da inspeção industrial e sanitária de produtos de origem animal, de 1952, foi substituído pelo novo regulamento através do decreto 9.013, agora orientado pelos princípios constitucionais do federalismo, da promoção das microempresas e das empresas de pequeno porte, no desenvolvimento científico e na inovação tecnológica, do respeito ao direito internacional, aos tratados pactuados pela República Federativa do Brasil e aos acordos bilaterais e multilaterais de equivalência, tendo por objetivo a racionalização, a simplificação e a virtualização de processos e procedimentos.
Este novo regulamento inseriu mudanças profundas na metodologia de trabalho do Serviço de Inspeção Federal a começar pela alteração dos princípios da inspeção permanente que vigorava para todos os tipos de estabelecimentos industriais, a mantendo apenas para os abatedouros, passando os demais a serem fiscalizados periodicamente através de auditorias.
Esta nova metodologia consagrou a tese de ser de responsabilidade dos estabelecimentos industriais a qualidade dos produtos por eles elaborados, com a obrigatoriedade da implantação dos chamados programas de autocontrole, desenvolvidos, implantados, monitorados e verificados pelo estabelecimento, com vistas a assegurar a inocuidade, a identidade, a qualidade e a integridade dos seus produtos, que incluam mas que não se limitem aos programas de pré-requisitos, boas práticas de fabricação, programa padrão de higiene operacional, análise de perigo e pontos críticos de controle.
Inspeção por auditoria
Agora com os critérios de atuação não mais por inspeção permanente mas por auditorias periódicas, o serviço passou a adotar, para definir a periodicidade, o chamado sistema de inspeção com base no risco, que tem como princípio a avaliação dos riscos, estimados associados a cada estabelecimento registrado, definindo a frequência mínima em anual, semestral, bimestral ou quinzenal, considerando os fatores: volume de produção, características do produto e desempenho do estabelecimento,.
Ainda como parte do Programa de Gerenciamento de Risco, o Plano Nacional de Controle de Resíduos e Contaminantes, PNCRC, objetivou promover a segurança química dos alimentos de origem animal através do monitoramento sistemático de resíduos químicos de importância em saúde pública em animais encaminhados para abate, em leite, ovos, mel e pescado, incluindo ainda ampla gama de medicamentos veterinários aprovados e não aprovados, agrotóxicos, contaminantes ambientais e industriais.
Serviço de Vigilância Agropecuária Internacional do Brasil
O Serviço de Vigilância Agropecuária Internacional do Brasil é o órgão do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento responsável pelos controles em portos, aeroportos e fronteiras internacionais com vistas a impedir a introdução e disseminação de pragas e agentes etiológicos de doenças que constituam ou possam constituir riscos à agropecuária, de forma a garantir a sanidade dos produtos importados e exportados.
Atua tanto nos terminais de cargas com interação, no caso dos produtos de origem animal, com o Serviço de Inspeção Federal quanto nos de passageiros em trânsito internacional, com interação com o Serviço de Defesa Sanitária Animal.
Assim, as atividades destes dois órgãos, o Serviço de Inspeção Federal e o Serviço de Vigilância Agropecuária, se completam nos casos de comércio internacional de produtos de origem animal, sejam nas exportações e principalmente nas importações onde, além da qualidade para consumo humano, é avaliado também os possíveis perigos zoosanitários que possam albergar e levar para o exterior, ou introduzir no Brasil, através da importações.
A introdução da peste suína africana no Brasil
Estes controles de barreiras sanitárias se intensificaram no Brasil a partir do ano de 1978, por força da introdução no país de um surto de peste suína africana, doença que acomete suínos com grande repercussão econômica, através do aeroporto internacional do Rio de Janeiro, Antonio Carlos Jobim (Galeão), originário de restos de alimentação de bordo de voo proveniente da península ibérica, levados clandestinamente para alimentação de suínos em uma propriedade do município de Paracambi no Estado do Rio de Janeiro.
Pela rápida iniciativa do Serviço de Defesa Sanitária Animal do Ministério da Agricultura à época, rapidamente os focos que já se espalhavam por vários municípios brasileiros foram identificados e isolados conseguindo-se, então, restringir as áreas focais com o sacrifício de todos os animais possíveis portadores e extinção da doença com um custo estimado em vinte e dois milhões de dólares, e o país ficando quinze anos sem poder exportar carnes ou derivados de suínos.
Transcrição da palestra do autor no VIII Seminário de Alimentação das Forças Armadas.
Por Carlos Alberto Magioli
Titular da AMVERJ, PhD, especialista em controle da qualidade dos alimentos
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